quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Sócrates - O filósofo da praça


      A imagem acima pintada por Jacques-Louis David em 1787, representa sem dúvida, um dos momentos mais instigante e misterioso da história da filosofia, a "morte de Sócrates". Na obra prima de David, Sócrates aparece sereno no leito de morte, discursando sobre a alma e a eternidade (destaca-se a mão direita alcançando a taça contendo o veneno mortal, a mão esquerda apontado para alto representando a morte como elevação da alma e o pesar e descontentamento de seus seguidores). 
          
VIDA E OBRA

         Nascido em Atenas em 470 ou 469 a. C., na época em que findava a guerra entre os gregos e os persas (guerras médicas) e quando a vitória da Grécia marcaria o início da fase áurea da democracia ateniense, Sócrates era filho de um escultor, Sofronisco, e de uma parteira, Fenareta. Teria seguido a profissão do pai por um tempo, embora tivesse recebido a educação dos jovens atenienses de seu tempo, aprendendo música, ginástica e gramática. Sócrates vivenciou a idade de ouro da civilização ateniense, era o famoso "século de Péricles". É o momento também dos grandes autores trágicos: Ésquilo morreu quando Sócrates tinha cerca de quatorze anos e Sófocles e Eurípedes eram aproximadamente dez anos mais velho que o filósofo.

   A Atenas no tempo de Sócrates: A cidade de Atenas é um ponto de convergência cultural e um laboratório de experiências políticas, onde se firmara, pela primeira vez na história dos povos, a tentativa de um governo democrático, exercido diretamente por todos os que usufruíam dos direitos de cidadania. A democracia* constituía assim, um elemento FUNDAMENTAL para se compreender as questões pensadas por Sócrates.


     O homem e a lenda: O próprio Sócrates nada deixou a respeito de suas atividades e de seu pensamento. As informações que se tem sobre sua vida e sobre seu ensinamento provêm de textos de discípulos, que podem ter retratado o mestre com os excessos ditados pela admiração e pelo afeto. Dos pensadores que se tem acesso e que retrataram a existência de Sócrates estão:

  • Aristófanes, "comediante" que satirizava o personagem Sócrates em suas comédias, dentre elas se destaca, n'As Nuvens onde o autor teria feito uma caricatura de Sócrates mais jovem; 
  • Xenofonte, é conhecido pelo seus escritos sobre a história de seu próprio tempo e pelos seus discursos de Sócrates, dentre eles se destacam, "Ditos e feitos memoráveis de Sócrates" e "Apologia de Sócrates";
  • Platão, a quem o pensamento socrático deve maior expressão, embora o próprio Platão tenha se ocupado do personagem Sócrates em suas obras para manifestar intenções particulares;
  • Aristóteles, que o apresenta como iniciador do trabalho de definição de conceitos relativos ao campo da moral;
  • Diógenes Laércio, historiador e biógrafo dos antigos pensadores gregos, a quem se deve a biografia de Sócrates proveniente da fase helenística.

      A filosofia socrática: Pode-se afirmar - a crer no depoimento da Apologia platônica - que a filosofia socrática possuía uma dimensão religiosa. Levado a dialogar com seus concidadãos, o filósofo grego não tinha pretensões de apresentar a verdade ou de impô-lá à mente dos mesmos, como se fosse ele o único capaz de fazê-lo. Ao contrário, a meta de Sócrates era levar ao seu interlocutor a tomada de consciência, de sua real situação, ou seja, de uma alma povoada de conceitos mal formulados e obscuros.
         Isso faz da filosofia socrática uma filosofia de introspecção, do retorno do sujeito para si mesmo (do eu comigo mesmo), reconhecendo seus limites, falhas e sobre tudo, sua ignorância. E somente depois desse reconhecimento de si, ou seja, de solapar os pilares que sustentavam suas "mini certezas" é que este mesmo homem poderia recobrar o direito de afirmar sua autonomia. 
         Nesse sentido, é válido afirmar que, o conhecimento que Sócrates propõe não pode ser ensinado, não constituí uma ciência sobre as coisas ou informações voltadas para a obtenção de prestígio ou de riquezas: é o conhecimento de si mesmo, a autoconsciência despertada e mantida em permanente vigília. 

       O método socrático: Atribuem ao filósofo grego o título de iniciador da filosofia moral e do método dialético, embora não seja pretensão desse texto discutir sobre a validade ou não dessa afirmação, vale lembrar que, teria sido Sócrates o precursor das questões morais e de ter instrumentalizado o diálogo enquanto uma ferramenta para o pensar.
       Ainda que o método socrático de busca pela verdade seja um tema complexo, é possível sintetizá-lo em três conceitos chaves, Dialética e o desdobramento dessa em Ironia e Maiêutica.
           A dialética socrática consiste no instrumento pelo qual Sócrates aborda seus interlocutores e os levam ao processo de reflexão filosófica. Como já dito, esse processo era produzido por meio do diálogo (realizados normalmente em ambientes públicos), onde o interlocutor apresentava uma ideia (TESE) sobre algum assunto específico e Sócrates por intermédio do questionamento refutava seu oponente (interlocutor) com uma ideia oposto (ANTÍTESE - ANTI "NÃO") e, por fim, desse embate e do reconhecimento dos limites do oponente, Sócrates o auxiliava a "parir" novas ideias (SINTESE).
        A Ironia consistia na primeira parte desse processo, onde era feita a pergunta para o interlocutor, mostrando assim a insuficiência de suas respostas. O mesmo sem conseguir driblar as adversidades  apresentada pelo filósofo grego se sentia "enfraquecido" e Ironizado. Essa era a forma de levar o ouvinte a dar conta de que não sabia aquilo que julgava saber e para melhor entender a si mesmo, era posta como finalidade, quebrar a solidez existente na própria pessoa. Assim, a ironia socrática tinha como função propiciar uma Catarse: uma purificação da alma por via da expulsão das ideias turvas.
         A Maiêutica*, termo grego que significa - ato de parir ideias, constituía a segunda parte do método de Sócrates, onde o interlocutor após perceber a insuficiência de suas resposta era levado, com o apoio do filósofo grego, a formular suas próprias ideias. Não mais se tratava de uma repetição automática de pensamentos "chavões", herdados pelos seus antigos valores e costumes. O conhecimento forjado desta vez pelo ouvinte, tinha suas raízes num processo de reflexão serena e sadia. Desse modo, esse mesmo ouvinte era convencido do bem que poderia ter pela purificação da alma, purificação esta que herdaria aprendendo a filosofar.
     
     A condenação de Sócrates e o embate com os sofistas: Diante do tribunal popular, Sócrates é condenado a morte por não reconhecer os deuses do Estado (Atenas), introduzir novas divindades (como a ideia de um deus interior - o que estava mais ligado a um processo de reflexão e busca da everdade) e corromper a juventude. Sempre sereno Sócrates refuta seus acusadores mostrando que seus argumentos são infundados e que o pedido de condenação não passava de uma apelação. Todavia, por receio da "emblemática" figura de Sócrates e de seus ideais revolucionários, os legisladores de Atenas optam por condená-lo a morte, desse modo, o filósofo foi obrigado a ingerir a cicuta, um veneno mortal. A reflexão produzida sobre a condenação  e morte de Sócrates está registrada na obra de Platão "A defesa de Sócrates".
         Outro ponto importante a ser destacado, embora brevemente, é o concernente ao embate entre Sócrates e os sofistas: O sofista era todo homem que possuía um conhecimento considerável sob os vários ramos do saber, se caracteriza por comercializar o saber, isto é, por cobrar para ensinar. "Tinham a pretensão de formar homens completos, habituados a todas as sutilezas do pensamento refletido, hábeis em manejar a palavra, corajosos e fortes na ação, dignos de todos os triunfos, de todas as felicidades". Landormy (1985:13).


       Sócrates combateu os sofistas, julgou com severidade o uso que faziam da arte da palavra, que segundo ele não visava estabelecer o verdadeiro mas produzir a aparência. Sócrates defendia energicamente a necessidade e a possibilidade de conhecer a verdade. Amava-a acima de tudo e tomou como ocupação exclusiva da sua vida, ajudar a descobrir em cada homem a verdade que nele existia.  Mesmo sem salário e quase sem esperança, exerceu até à morte este serviço de educador do seu povo, o mais insubmisso de todos os povos. É esta a sua maneira de ser cidadão.



CONTEÚDOS RELACIONADOS

      Existe um acervo imenso sobre a vida e obra de Sócrates, basta pesquisar um pouquinho que será possível encontrar excelentes materiais. Mas para facilitar nessa procura disponibilizo, logo abaixo, alguns links referentes aos materiais que encontrei.



  • O link a seguir foi postado por mim no megaupload, trata-se de um filme produzido por Roberto Rossellini em 1970. Vale a pena assistir! muito bem produzido.
                                
 

BAIXAR FILME 
BAIXAR LEGENDA 




Não conseguiu baixar o filme?



  • Esse vídeo foi extraído do you tube, produzido pela professora Viviane Mosé, também é muito interessante e didático.



LINKS DE LIVROS, TEXTOS e SITES

  • Abaixo estão alguns links de livros, artigos e textos sobre Sócrates

      LIVRO:  -  APOLOGIA DE SÓCRATES - PLATÃO  (CLIQUE PARA BAIXAR)


                        - COLEÇÃO OS PENSADORES - VOL. 2 (Aqui tem Platão: "A defesa de Sócrates, Xenofonte: "ditos e feitos memoráveis de Sócrates" e "Apologia de Sócrates", Aristófanes: "As Nuvens").




            Artigo: - Artigo - Sócrates e a busca da sabedoria


 Blog com conteúdo sobre Sócrates: BLOG SOBRE FILOSOFIA




ESQUEMÃO




QUESTÕES DE VESTIBULAR


1)(UFU 2 a fase SETEMBRO de 2002 )

Leia, abaixo, o trecho de Platão, extraído da Apologia de Sócrates.
“(…) descobrem uma multidão de pessoas que supõem saber alguma coisa, mas que na verdade pouco ou nada sabem. (…) e afirmam que existe um tal Sócrates (…) que corrompe a juventude. Quando se lhes pergunta por quais atos ou ensinamentos, não têm o que responder; não sabem, mas para não mostrar seu embaraço apresentam aquelas acusações que repetem contra todos os que filosofam: ‘as coisas do céu e o que há sob a terra; o não crer nos deuses; fazer prevalecer o discurso e a razão mais fraca’. Isso porque não querem dizer a verdade: terem dado prova de que fingem saber, mas nada sabem.” Apol., 23 c-e.
A partir do trecho apresentado acima, responda às seguintes questões.

A) Para Platão, qual a verdadeira acusação que se faz contra Sócrates?

B) Quais elementos característicos da filosofia socrática podem ser extraídos deste trecho?

C) Que acusações, tendo em vista as características específicas da filosofia de Sócrates, são apresentadas como não tendo fundamento?


2) (PUC- RIO) No processo formal, Sócrates é acusado de:



A) agir como traidor numa batalha naval e corromper os jovens.
B) liderar uma nova seita religiosa e organizar uma rebelião política.
C) não crer nos deuses reconhecidos pela cidade e corromper a mocidade.
D)  praticar a sofística e ser homossexual.



3) (UnB) Sócrates não foi muito bem aceito por parte da aristocracia grega, pois defendia algumas idéias contrárias ao funcionamento da sociedade grega. Criticou muitos aspectos da cultura grega, afirmando que muitas tradições, crenças religiosas e costumes não ajudavam no desenvolvimento intelectual dos cidadãos. Sobre este filósofo é correto afirmar: 



a) Sua arte de dialogar, conhecida como maiêutica, provocava aquilo que ficou conhecido como "a parturição das idéias".

 b) Sua arte de dialogar, conhecida como dialética, provocava aquilo que ficou conhecido como "a parturição das idéias".

 c) Sócrates nasceu em Atenas e morreu na mesma cidade, anos mais tarde, de velhice.

 d) Sócrates procurava responder à questões do tipo: "O que é a natureza ou o fundamento último das coisas?"

 e) N. D. R.





Gabarito na postagem seguinte

* Trataremos em outro momento das questões cruciais sobre a democracia ateniense.
* Sócrates faz referência a profissão de sua mãe, parteira, segundo o filósofo sua intenção é similar àquela, isto é, de levar as pessoas a "dar a luz" a novas ideias.

Me ajude por favor!

Bom pessoal,
esta postagem é para ajudar aqueles que possuem alguma dificuldade na hora de baixar, assistir, colocar legenda,  enfim, no momento de usufruir dos videos postado pelo Blog meditações.


  • Como faço para baixar o filme?
 É bem simples, primeiro passo, clique no texto que indica o material a ser baixado, exemplo, BAIXAR FILME ou no "NOME DO ARQUIVO" (LIVRO, TEXTO, MÚSICA);
Segundo passo, você será redirecionado para uma outra página onde o material estará hospedado, normalmente eu mesmo faço as postagem no MEGAUPLOAD. Aparecerá uma tela constando: o material a ser baixado, a descrição e as duas opções para baixar - Download Premium e Download Comum.

Terceiro passo, espere os segundo "zerarem" e escolha a opção Dowload Comum, pronto você baixou o conteúdo!

  • Como faço para assistir?
Muitos dos filmes disponíveis estão em formatos que os programas básicos que possuímos no computador não "roda". Mas isso é fácil de resolver, basta baixar um Pack com os codecs necessários para fazer os vídeos funcionarem. Abaixo disponibilizo  o link com esses codecs, é só baixar e instalar no seu PC, observação, é preciso que você tenha o Windows Média Player.


  • Não consigo por Legenda?
É simples, coloque o vídeo e a legenda numa mesma pasta e renomeie os dois com o mesmo título (nome), ex: Sócrates para o vídeo e Sócrates para a legenda, pronto pode assistir!

QUALQUER DÚVIDA MANDE UM COMENTÁRIO!

domingo, 13 de fevereiro de 2011

QUEM ÉS TU, Ó LIBERDADE?



"...Liberdade, essa palavra
que o sonho humano alimenta
que não há ninguém que explique
e ninguém que não entenda..." 

Cecília Meireles - Romanceiro da Inconfidência



   Não irei tratar da liberdade no seu sentido metafísico, desta que simplesmente  basta fechar os olhos e se aprisionar nas armadilhas da imaginação. Não tenho pretensões de apresentá-la sob a ótica da ontologia, sinto certo receio dos caminhos que tais elucubrações poderiam me levar. Aliás, como bem lembra F. Pessoa, "há metafísica bastante em não pensar em nada" e seguindo o seu conselho irei traçar um caminho que não se arrisca, pela incapacidade, a adentrar ao reino dos imortais. A liberdade que irei expressar é aquele que veste a alma humana e que encontra sua digna expressão na política. 
         Eis que, por ela e em nome dela, impérios se levantaram e sucumbiram, guerras e revoluções se legitimaram, multidões se lançaram as ruas materializando o "POVO", fazendo ecoar a unidade, o coletivo, o público ao ritmo da Liberdade, Liberdade, Liberdade! Instaurando o "Terror", silenciando ditaduras, derrubando regimes, desatando "nós", correntes e ideologias que massificam e aprisionam a mente humana.
       A liberdade que recobro está muito além do sentido atribuído pelos homens de agora, que acreditam serem livres por gozarem de seus bens e propriedades, como se fosse possível exteriorizar nas coisas que possuem a essência do homem enquanto ser livre. Essa noção marginal e trivial da liberdade, isola o homem do mundo e o faz acreditar que no deleite de suas conquistas privadas reina a máxima da liberdade.
        Não percebem, pela indolência do tempo, que o ideal a qual agarram com unhas e dentes, não descreve um discurso libertário mas ao contrário, contribui para a "servidão voluntária", servidão esta que pela ironia do destino se denomina historicamente "Liberalismo".
           Poderás ainda, pelo calor do discurso, definir a liberdade como limites de arbítrios, esta que se conjuga na máxima de que "a liberdade de cada sujeito vai até onde começa a do outro (semelhante)". Sem dúvida, isso não caracteriza um sentido político de Liberdade, embora manifeste um sentido comum e usual. Esse discurso costumeiro camufla um ideal do capital que passa a considerar o homem não mais como um ser social (Aristóteles), ao contrário, postula uma nova essência humana baseada no individualismo e egocentrismo. 
      Pensar a liberdade tendo o "outro" como um obstáculo e limite é não pensar a liberdade, é todavia, aceitar o homem como um átomo isolado disperso pelo mundo. Como posso ser livre estando só ? O eu comigo mesmo! Nem desfrutando das maiores riquezas desse mundo, poderei dizer, sob o julgo da minha própria consciência, que sou um homem livre.
        A liberdade que outrora incomodava as mentes sãs e que humildemente procuro revogar nesse texto, é aquela que não se limita ao espaço do labor e produção, mas que se espalha pelo mundo afora, invadindo corpos estranhos, confrontando-se com opiniões divergentes. A autêntica liberdade é política, pública e social. Se concretiza na ação, na capacidade de sair do isolamento e se colocar a disposição ou mesmo, ao enfrentamento do outro.
        Sob esta ótica, o mundo da liberdade é o mundo público e não mais o privado. Sua realização está na construção do coletivo e seu instrumento é o diálogo, a porta de acesso para o mundo, onde as aspirações, vontades e ideais possam se manifestar revelando os seres e sua intenções. 
Eis ai, um sentido digno de Liberdade!  
Por:   Maicon Fortunato

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

"Res" publica


(Guernica - Picasso)

"A mente de um empreendedor é uma doença social, cuja as dimensões diabólicas o próprio Cristo é incapaz de conhecer" - August Ramon.

Quando o público se torna privado,
a cidade passa a ser uma empresa,
a sociedade, clientela,
a máquina estatal, uma fonte de investimento,
o bem público, o quintal do administrador.

Quando o público se torna privado,
a segurança se transforma em milícias,
a saúde se desintegra,
a educação se pulveriza,
o social é extinguido.

Quando o público se torna privado,
o caos se instaura,
se institui a corrupção,
as virtudes se tornam raras,
os vícios abundantes.

Quando o público se torna privado,
a política falece,
a democracia é censurada,
o povo é suprimido
e a liberdade é silenciada.

Quando o público se torna privado,
se perde a identidade,
se apaga a história, as raízes,
os costumes, os valores, a cultura,
a MEMÓRIA.


                                                        Maicon Fortunato.



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